quinta-feira, 13 de julho de 2017

Desmatamento legal zero!



* Ecio Rodrigues
Perante o mundo – vale dizer, a quase totalidade dos países existentes no planeta e que assinaram o Acordo de Paris – os brasileiros se comprometeram a zerar a taxa anual de desmatamento ilegal na Amazônia até 2030.
Dada a dificuldade tupiniquim em fazer cumprir a legislação ambiental, os países receberam com entusiasmo o compromisso brasileiro.
Não é preciso fazer referência à desonra embutida no fato de uma nação soberana, assumindo sua incapacidade, ser forçada a prometer, no âmbito de um acordo internacional, que vai fazer valer sua própria lei em seu próprio território.
Sem embargo, a persistência do desmatamento anual na Amazônia, que apresenta taxas elevadas desde 1988, quando se iniciaram as medições (antes deviam ser até maiores, já que passavam despercebidas) não será resolvida por meio da fiscalização.
Acontece que, em relação ao combate ao desmatamento na Amazônia, a atuação dos gestores públicos se resume basicamente a duas estratégias: priorizar o investimento na fiscalização e aumentar a produtividade das áreas desmatadas.
No primeiro caso, as fragilidades do sistema de fiscalização, em todos os campos, inclusive no tributário (que, como se sabe, tem primazia na aplicação dos recursos públicos), são amplamente comprovadas, já tendo sido objeto de diversos e recorrentes estudos. Na área ambiental, que nunca foi, e nunca será, considerada prioridade, a relação custo-benefício do aparato de fiscalização é muito desfavorável para a sociedade.
Ou seja, gasta-se dinheiro público demais com retorno de menos. É notória a condição de inexequibilidade que caracteriza as autuações com base na Lei de Crimes Ambientais – em que mais de 90% das multas não são arrecadadas, como também já demonstrado por numerosas pesquisas.
Esperar alteração no quadro caótico da fiscalização brasileira na esfera ambiental é um erro absurdo, pois são mais de 40 anos de estabilidade nas estatísticas, com poucos períodos nos quais a fiscalização obteve algum resultado, contudo, sempre muito abaixo dos custos realizados pela sociedade.
Pior que a aposta na fiscalização é a segunda estratégia, que segue o raciocínio de que o produtor precisa de alternativa para não exercer o direito de desmatar, sendo que essa alternativa – pasme-se! – consiste em aumentar a produtividade da área desmatada. Não parece insano?
Aumentar a renda do produtor em cada hectare de área desmatada não evita o desmatamento, pelo contrário; fornecer assistência técnica com profissionais que são peritos em área desmatada não ajuda a floresta, pelo contrário.
Enfim, dobrar de um para duas a quantidade de vacas produzidas em cada hectare de capim plantado terá o efeito de atrair ainda mais o produtor para a atividade, e não de afastá-lo.
Diante da persistência da taxa de desmatamento anual na Amazônia, que se mantém, a despeito de todos os investimentos realizados na fiscalização e no aumento da produtividade das terras desmatadas, parece insensato concluir que esse caminho evitará novos desmatamentos.
Por isso, a discussão deve se voltar para o desmatamento legalizado, e não para o ilegal. Mas salta aos olhos a indiferença dos gestores estatais no que diz respeito à busca de soluções para zerar o desmatamento amparado pela legislação. Esse tema nunca sequer entrou na pauta de discussão, e as razões para isso são impossíveis de se compreender.
A conclusão, no final das contas, é que existe uma dificuldade crônica em aceitar a solução que a ciência encontrou para superar a atração do produtor pelo desmatamento legalizado, qual seja: explorar a biodiversidade e assim ampliar o valor econômico da floresta.

*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

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