* Ecio Rodrigues
Perante o
mundo – vale dizer, a quase totalidade dos países existentes no planeta e que
assinaram o Acordo de Paris – os brasileiros se comprometeram a zerar a taxa
anual de desmatamento ilegal na Amazônia até 2030.
Dada a
dificuldade tupiniquim em fazer cumprir a legislação ambiental, os países receberam
com entusiasmo o compromisso brasileiro.
Não é
preciso fazer referência à desonra embutida no fato de uma nação soberana, assumindo
sua incapacidade, ser forçada a prometer, no âmbito de um acordo internacional,
que vai fazer valer sua própria lei em seu próprio território.
Sem
embargo, a persistência do desmatamento anual na Amazônia, que apresenta taxas elevadas
desde 1988, quando se iniciaram as medições (antes deviam ser até maiores, já
que passavam despercebidas) não será resolvida por meio da fiscalização.
Acontece
que, em relação ao combate ao desmatamento na Amazônia, a atuação dos gestores
públicos se resume basicamente a duas estratégias: priorizar o investimento na
fiscalização e aumentar a produtividade das áreas desmatadas.
No primeiro
caso, as fragilidades do sistema de fiscalização, em todos os campos, inclusive
no tributário (que, como se sabe, tem primazia na aplicação dos recursos
públicos), são amplamente comprovadas, já tendo sido objeto de diversos e
recorrentes estudos. Na área ambiental, que nunca foi, e nunca será, considerada
prioridade, a relação custo-benefício do aparato de fiscalização é muito
desfavorável para a sociedade.
Ou seja,
gasta-se dinheiro público demais com retorno de menos. É notória a condição de inexequibilidade
que caracteriza as autuações com base na Lei de Crimes Ambientais – em que mais
de 90% das multas não são arrecadadas, como também já demonstrado por numerosas
pesquisas.
Esperar
alteração no quadro caótico da fiscalização brasileira na esfera ambiental é um
erro absurdo, pois são mais de 40 anos de estabilidade nas estatísticas, com
poucos períodos nos quais a fiscalização obteve algum resultado, contudo, sempre
muito abaixo dos custos realizados pela sociedade.
Pior que a
aposta na fiscalização é a segunda estratégia, que segue o raciocínio de que o
produtor precisa de alternativa para não exercer o direito de desmatar, sendo
que essa alternativa – pasme-se! – consiste em aumentar a produtividade da área
desmatada. Não parece insano?
Aumentar
a renda do produtor em cada hectare de área desmatada não evita o desmatamento,
pelo contrário; fornecer assistência técnica com profissionais que são peritos
em área desmatada não ajuda a floresta, pelo contrário.
Enfim, dobrar
de um para duas a quantidade de vacas produzidas em cada hectare de capim
plantado terá o efeito de atrair ainda mais o produtor para a atividade, e não de
afastá-lo.
Diante da
persistência da taxa de desmatamento anual na Amazônia, que se mantém, a
despeito de todos os investimentos realizados na fiscalização e no aumento da
produtividade das terras desmatadas, parece insensato concluir que esse caminho
evitará novos desmatamentos.
Por isso,
a discussão deve se voltar para o desmatamento legalizado, e não para o ilegal.
Mas salta aos olhos a indiferença dos gestores estatais no que diz respeito à
busca de soluções para zerar o desmatamento amparado pela legislação. Esse tema
nunca sequer entrou na pauta de discussão, e as razões para isso são
impossíveis de se compreender.
A
conclusão, no final das contas, é que existe uma dificuldade crônica em aceitar
a solução que a ciência encontrou para superar a atração do produtor pelo
desmatamento legalizado, qual seja: explorar a biodiversidade e assim ampliar o
valor econômico da floresta.
*Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro
florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento
Sustentável pela Universidade de Brasília.