segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Cacau nativo vale mais que cultivado

* Ecio Rodrigues
Desde 2007, um grupo de pesquisadores vinculados à Engenharia Florestal da Universidade Federal do Acre, Ufac, estuda o manejo florestal comunitário do cacau nativo. A ideia principal é instituir procedimentos técnicos que possibilitem a ampliação da produtividade do cacaueiro localizado em ambiente natural, a fim de atender a uma crescente demanda de mercado.
Ou seja, como há evidências de que existem compradores no mercado dispostos a adquirir até quatro vezes mais que a quantidade de cacau nativo anualmente produzido, o desafio é conseguir quadruplicar essa produção, sem apelar para a solução usual da domesticação e do cultivo.
Ocorre que o diferencial de mercado do chocolate produzido com sementes de cacau nativo, em comparação com o cacau cultivado e melhorado geneticamente, é o fato de que a semente do cacau nativo possui um sabor considerado especial por ser selvagem, primitiva e original.
Como dizem os franceses, o “flavor” (combinação entre o sabor e o aroma do chocolate) produzido pela semente de cacau nativo é deveras superior. Mesmo não existindo uma comprovação científica acerca da superioridade do flavor do cacau nativo, o mercado tem crescido a taxas consideráveis.
A produção de cacau nativo possui duas características principais. Em primeiro lugar, todo o processo produtivo é realizado por meio de um fluxo contínuo de atividades que podem ser melhoradas mediante a adoção de inovações tecnológicas elementares; em segundo lugar, a semente de cacau, para ser produzida com a qualidade requerida pelo mercado, exige rotina de produção e disciplina rigorosas, definidas pelo tempo necessário para cada etapa do processo.
Uma vez colhido, o fruto tem que ser quebrado em até 5 dias. Uma vez quebrado, a semente tem que ser fermentada em até 7 dias. Uma vez fermentada, a semente tem que ser seca em até 40 dias. Só depois desses procedimentos, a semente é embalada em sacos de lona e embarcada em balsa que leva até 60 dias para chegar à Europa. Desvios nesses prazos estragam a semente e acarretam perdas irreparáveis.
A solução apontada pelos engenheiros florestais reforça a necessidade de se elaborar o Plano de Manejo Florestal Comunitário para o Cacau Nativo. Esse documento orienta os manejadores sobre como proceder em todo o processo produtivo, de forma a aumentar a produtividade.
Sob o apoio do CNPq, os pesquisadores definiram um conjunto de 6 protocolos de manejo florestal comunitário, que, uma vez executado, ajuda a alcançar uma produtividade satisfatória de sementes de cacau em 3 anos.
Os manejadores de cacau nativo poderão obter maior produtividade mantendo o cacaueiro em ambiente florestal nativo, de modo a atender a um mercado que apresenta potencial elevado de demanda. Trata-se de um nicho de mercado para chocolates exclusivos e que paga maior preço pelo produto.
Por outro lado, a produção de cacau nativo é bastante atrativa do ponto de vista econômico. Estudos realizados junto aos manejadores localizados no rio Purus demonstram que a produção de cacau nativo é a que melhor remunera o trabalho realizado pelas comunidades ribeirinhas, chegando a 50 reais a diária, o que adquire importância sensível para dinâmica econômica local.
Finalmente, a produção manejada de sementes de cacau nativo pelas comunidades se viabiliza, na medida em que exige investimentos adequados à realidade do pequeno produtor florestal amazônico, que pode optar por iniciar sua produção no curto prazo, com a oferta de uma quantidade expressiva de sementes.
Trata-se de um produto único, pois possui, além do flavor, o ingrediente da sustentabilidade, ao favorecer a manutenção da floresta na Amazônia.


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Acordo do clima selado na COP 21 de Paris

* Ecio Rodrigues
A Convenção sobre Mudança Climática foi assinada em 1992, durante a realização da Rio 92. A partir de então, todos os anos os países se reúnem para discutir o tema e negociar as metas destinadas a mitigar os efeitos do aquecimento do planeta.
E ainda que no início – sobretudo até 1997, quando da aprovação do Protocolo de Kyoto – houvesse um pequeno grupo de países e cientistas que teimava em negar a ocorrência do aquecimento, hoje é possível dizer que a Conferência das Partes da Convenção-Quadro sobre Mudança do Clima, COP da sigla em inglês, se transformou num dos principiais eventos realizados sob a chancela das Nações Unidas, a ONU, sempre gerando muita expectativa em âmbito mundial.
Embora a sociedade cobre mais empenho para o estabelecimento de regras que minimizem a crise ecológica atual, o fato é que, sob a velha sistemática que prevê um passo de cada vez, nos últimos 20 anos se conseguiu avançar de maneira surpreendente e até certo ponto inusitada para o padrão ONU.
Em 2015, depois de superarem as resistências quanto à constatação de que o clima do planeta está sendo alterado e, mais importante ainda, de reconhecerem que essa mudança não é natural, mas decorrente do modo de vida atual, os países associados à ONU chegaram à realização da 21ª COP, em Paris.
Pela primeira vez os Estados Unidos se uniram à União Europeia e também aos países insulares (mais afetados pelo aquecimento, em função do aumento do nível do mar causado pelo derretimento das calotas polares), formando uma coligação com o sugestivo nome “Coalizão da Ambição” – numa alusão às 3 principais expectativas que, esperava-se, fossem atendidas no processo de negociação.
Em primeiro lugar, e suplantando-se o voluntarismo característico do Protocolo de Kyoto, as metas de redução do carbono (leia-se fumaça) lançado na atmosfera deveriam ser obrigatórias – ou legalmente vinculantes, no dizer dos diplomatas.
Em segundo, e mais importante para as nações desenvolvidas, essas metas deveriam ser anualmente quantificadas, para só então ser avaliadas. Para tanto, o primeiro passo foi obrigar os países a estimar, ainda antes da abertura da COP 21 e no intuito de demarcar um índice para as negociações, a quantidade de carbono que deixariam de emitir a cada ano.
Por fim, a terceira expectativa, e provavelmente a mais importante para os países em desenvolvimento, inclusive o Brasil, diz respeito ao pagamento da conta necessária para a adaptação desses países a uma economia que reduza paulatinamente o uso de petróleo e carvão mineral em suas matrizes energéticas.
As expectativas do mundo foram atendidas no “Acordo de Paris”, o pacto aprovado no sábado, dia 12/12/2015. Por essa razão, e também porque foi assinado por todos os 195 países associados à ONU, o acordo imediatamente passou a ser considerado um documento histórico.
As metas são obrigatórias, na medida em que as ações com as quais os países se comprometeram serão auditadas e revisadas pela ONU a cada 5 anos, a partir de 2020. Definiu-se como objetivo no documento uma redução, na temperatura do planeta, “muito abaixo de 2o C”, fazendo-se referência a uma minoração “ideal” de 1,5o C.
Criou-se o “Fundo de Adaptação”, no montante anual de 100 bilhões de dólares, para subvenção das economias frágeis. O dinheiro deverá sair da conta dos países ricos e abastecer um fundo internacional, que, por sua vez, vai estabelecer as regras de transferência para os países em desenvolvimento. Regras complexas, mas aferíveis, de forma a vincular o recebimento do dinheiro à realização de ações voltadas para evitar o desmatamento, diminuir a dependência do petróleo e assim por diante.
Trata-se, não há dúvida, de uma guinada nos rumos da existência humana, e a história há de registrá-la. Cabe a nós, brasileiros, honrar a palavra dada ao mundo de zerar o desmatamento na Amazônia – o legal e o ilegal.


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

domingo, 6 de dezembro de 2015

Expectativas amazonenses para a COP 21

* Ecio Rodrigues
No Amazonas, a classe política, de forma preponderante e inusitada, acredita enfaticamente no grande equívoco de que a Zona Franca de Manaus funciona como freio para o desmatamento. Tal convicção se escuda nas baixas taxas anuais de desmatamento observadas naquele estado, que deixam os amazonenses bem distantes dos elevados índices exibidos pelos paraenses, seus competidores diretos pelo domínio econômico regional.
Trata-se de um grande equívoco, porque a atividade produtiva desenvolvida no âmbito do modelo de Zona Franca, caracterizada, nesse caso, pela presença de montadoras de artigos como eletroeletrônicos e veículos de duas rodas, não tem qualquer tipo de interferência sobre a taxa de desmatamento.
Com efeito, não seria sensato supor que um setor industrial cujos artefatos são produzidos em unidades fabris instaladas na região Sudeste e apenas montados em Manaus (no intuito exclusivo de obter benefícios fiscais) seja capaz de intervir no processo de ocupação produtiva desencadeado no meio rural amazonense.
Insensatez ou não, esse pseudoargumento, que as montadoras da Zona Franca de Manaus refreiam o desmatamento, foi largamente utilizado – com sucesso, aliás – para convencer os parlamentares em Brasília a prorrogar os benefícios fiscais inerentes à Zona Franca até 2073. Um disparate, claro.
Muito provavelmente, as reduzidas taxas de desmatamento medidas no Amazonas estão relacionadas, em primeiro lugar, à gigantesca superfície territorial desse estado, que alcança 157,07 milhões de hectares – a maior do país.
Em segundo lugar, também tem grande influência a localização geográfica do Amazonas.  Além de se distanciar da frente de expansão agropecuária representada pelo Arco do Desmatamento, o território amazonense não possui ligação rodoviária com o restante do país. Essa condição, é bom ressalvar, poderá ser fortemente alterada com a conclusão da rodovia BR 319, que vai de Manaus a Porto Velho, em Rondônia.
Não à toa a área desmatada se concentra nas porções sul e sudeste do estado, mais próximas e com acesso ao Arco do Desmatamento. Por sinal, o maior rebanho estadual pertence ao Município de Boca do Acre, que faz divisa com o Acre e é ligado a este por estrada.
A pecuária é a atividade com maior taxa de crescimento e a principal responsável pela ampliação do desmatamento. Por outro lado, as Reservas Extrativistas, que podem funcionar como alternativa ao modelo colonizador assentado na criação de gado, integram uma parcela de terra considerável, totalizando 3,51 milhões de hectares, de acordo com o censo agropecuário de 2006.
Diante dessa realidade, é razoável prever que, dos estados amazônicos, o Amazonas pode ser o mais impactado pelos resultados da COP 21, conferência da ONU sobre mudanças climáticas que acontecerá em Paris, França, em dezembro próximo.
Diferentemente do que ocorre com os vizinhos Rondônia e Pará, o Amazonas não tem consolidada a opção pelo agronegócio, ao tempo em que possui expressiva área destinada às Reservas Extrativistas e à mata ciliar. Desse modo, o estado tem a chance se firmar como exemplo de projeto de economia de baixo carbono – o que seria inédito na região.
Experiências já realizadas, sob tímida alocação de recursos até o momento, como o Centro de Biotecnologia da Amazônia, a Bolsa Verde e assim por diante, poderão receber apoios expressivos de outros países, de forma a adequar o processo de ocupação produtiva levado a cabo pelos amazonenses aos padrões de sustentabilidade mundialmente requeridos.
Ainda que os políticos queiram atrelar o futuro do estado à existência da Zona Franca, o Amazonas poderá traçar um caminho bem diferente. É esperar para ver!  


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

Expectativas paraenses para a COP 21

* Ecio Rodrigues
Tendo sobrevivido intacto ao plebiscito que daria lugar a três novos estados, o Pará continua a ser, de longe, o diferencial diante das frágeis economias da região amazônica. Tanto pela fartura em minérios quanto pela pujança do agronegócio, os paraenses podem se orgulhar de ostentar a economia mais forte da Amazônia.
Voltada predominantemente para a produção de carne de boi, a concentração fundiária observada no meio rural chega a assustar. Mais de 90% da terra empregada na produção primária pertence a menos de 10% dos empreendimentos, com Índice de Gini de 0,822, de acordo com o mais recente censo agropecuário, realizado em 2006.
Não à toa, desde meados da década de 2000 o Pará apresenta as maiores taxas anuais de desmatamento da Amazônia. Essa situação deve se agravar com a pavimentação da BR 163 (ligando Cuiabá a Santarém), a ser concluída ainda em 2015.
Por outro lado, mais da metade do território paraense não está disponível para o agronegócio, uma vez que, segundo o setor de Monitoramento por Satélite da Embrapa, o perímetro destinado às Unidades de Conservação (estaduais e federais) e às Terras Indígenas abrange 54,67% da área estadual.
Há que se adicionar aí o quinhão das propriedades rurais que de forma compulsória a legislação contingencia como Reserva Legal e onde a implantação do agronegócio é proibida, sendo possível apenas a produção de madeira sob a tecnologia do manejo florestal. Ainda segundo a Embrapa, essa categoria especial de áreas protegidas ocupa 453.100 hectares.
Essa distribuição fundiária sugere que em apenas 9,07% do total de 1.249.179 km2 que integram o território estadual não existe impedimento legal para implantação da pecuária e cultivo de grãos (sobretudo soja).
Na verdade, a restrição é ainda maior, já que esse cômputo não leva em consideração a superfície classificada como Área de Preservação Permanente, ou APP. Para resumir, APPs são os fragmentos de floresta que protegem a água dos rios e igarapés. Significa dizer que quanto maior a rede hidrográfica, mais extensas serão as faixas de APPs.
Todavia, parece que esses números não batem com as taxas recordes de desmatamentos ostentadas pelo Pará nos últimos 10 anos. É possível concluir, na melhor das hipóteses, que não há espaço territorial disponível, segundo a legislação vigente, para ampliação das áreas destinadas ao agronegócio no Pará.
Ou, para ser mais claro: no Pará, todo desmatamento pode ser ilegal.
A expectativa dos paraenses para a COP 21, a reunião da ONU que será realizada em dezembro próximo em Paris, França, com o propósito de negociar um novo acordo climático global, depende, em última instância, da capacidade do Brasil em honrar os compromissos que já apresentou para negociação na conferência – sobretudo com relação à recuperação de pastagens degradadas, restauração florestal de mata ciliar e construção de hidrelétricas.  
Ocorre que, na condição de um dos maiores, senão o maior, produtor nacional de energia elétrica gerada das águas, o Pará deverá abrigar novas hidrelétricas, que se somarão à de Tucuruí e à polêmica usina de Belo Monte.
A ampliação da produção mundial de energia limpa por meio do aproveitamento da força das águas será, seguramente, uma das principais metas acordadas entre os países e um dos pontos principais para a redução das emissões de carbono do Brasil até 2020.
Como só no rio Tapajós está prevista a construção de mais 7 hidrelétricas, a capacidade produtiva dos paraenses pode dobrar. É esperar para ver.


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e Mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

Expectativas acreanas para a COP 21

* Ecio Rodrigues
Durante toda a década de 1990 e um pedaço da seguinte, o Acre gozou do status de bom exemplo quando o assunto era o desmatamento na Amazônia. Ostentando taxas quase sempre inferiores às demais localidades amazônicas, o estado se orgulhava de sua reputação ambientalista.
Mas, como costuma acontecer com tudo o que é frágil, com toda conjuntura que não decorre de diretrizes inequívocas e políticas bem resolvidas, essa situação em muito se alterou.
Sem tentar estabelecer o ano, ou o momento histórico, como gostam os historiadores, em que a ação estatal para contenção do desmatamento descarrilhou, o fato é que as estatísticas de desmatamento no Acre assustam o governo federal e os ambientalistas – que, aliás, sempre foram aliados de plantão.
Os números atuais sobre a dinâmica do desmatamento na Amazônia apontam que dois municípios do Acre figuram entre os dez que mais desmatam na região.
Foi assim em 2014, e tudo indica que continuará assim em relação ao período que vai de agosto de 2014 a julho de 2015, cujo diagnóstico o Inpe deve publicar nas próximas semanas.
Por sinal, existe a possibilidade de o relatório sobre o desmatamento trazer números vexaminosos justamente no momento em que a comitiva de autoridades públicas estaduais arruma as malas para ir a Paris prestigiar a COP 21.
Acontece que, bem diferente do ambientalista de outrora, o Acre de agora deverá reconhecer o esgotamento do discurso de sustentabilidade, que tanto ajudou a eleger seus políticos.
Tudo indica que o propósito de estabelecer o diferencial de uma sociedade que respeita o meio ambiente e valoriza a floresta se perdeu, diante da ausência de investimentos estatais que transformassem em realidade o que era repetido nos palanques eleitorais.
Ao que parece, é preciso muito mais vontade e competência que discursos e preleções para se alcançar uma saída que forneça trabalho e renda por meio da criação de um Cluster Florestal – vale dizer, um sistema de produção baseado na exploração da biodiversidade presente no ecossistema florestal, compreendendo um aglomerado de empresas do setor primário, secundário e terciário e com escala de produção pequena, média e grande.
Talvez o fato mais emblemático dessa triste mudança de rumo, que reflete uma realidade que desmascara a continuidade da pregação de que o Acre é sustentável, tenha sido a extinção da Secretaria de Florestas.
Na condição de espaço estatal para discussão e aperfeiçoamento de um setor que abrange desde o seringueiro ao industrial da madeira, a lacuna deixada pela Secretaria de Florestas não foi preenchida e não há perspectiva para a condução da política estadual destinada à produção florestal.
Aos extrativistas, que se encontravam em processo de mobilidade social para atingir o patamar de manejadores florestais, resta a opção pela pecuária, setor para o qual o apoio estatal nunca deixou e nunca deixará de chegar.
Aos industriais da madeira – uma vez que o setor industrial, inclusive aquele vinculado à construção civil, não representa, e não representará no médio prazo, alternativa de investimento no Acre – resta ouvir o gerente do Basa, que há 30 anos vem repetindo: é melhor investir na pecuária.
Aos gestores do Acre presentes na COP 21 resta pouca coisa a oferecer – e, inevitavelmente, muito a explicar.

* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.


Expectativas rondonienses para a COP 21


* Ecio Rodrigues
Há alguns anos, falava-se na possibilidade de “rondonização” do Acre. Essa ameaça assustou os acreanos a tal ponto que serviu, inclusive, como mote para algumas campanhas eleitorais bem sucedidas. Parecia existir uma rivalidade subliminar entre os dois estados, ante a qual ficava subtendido que, pelo lado de Rondônia se endossava um progresso a qualquer custo e, pelo lado do Acre, um ambientalismo sem custo algum. Dois extremos, obviamente.
E provável que a realidade hoje já não justifique o temor dos acreanos, afinal, ao optar pelo agronegócio em detrimento do ambientalismo supostamente invocado pelo estado vizinho, Rondônia logrou melhorar significativamente o seu IDH.
Evidente que uma decisão de tal porte, pelo agronegócio, traz consequências igualmente decisivas para a sociedade e para os rumos da ocupação produtiva em território estadual. Durante as décadas de 1980 e 1990, Rondônia figurou, em conjunto com Pará e Mato Grosso, entre os maiores desmatadores da Amazônia.
A consolidação desse processo de ocupação produtiva, baseado primordialmente nos plantios de soja e na criação de boi, custou ao estado a redução de suas florestas a menos da metade da superfície antes ocupada pelo ecossistema florestal natural.
Para acalmar os poucos ambientalistas locais, e os muitos de outras paragens, os gestores estaduais foram levados a realizar o zoneamento. Sob pressão do governo federal (que, por sua vez, era pressionado pelo mercado internacional das commodities) e com dinheiro emprestado do Banco Mundial, o Zoneamento Ecológico-Econômico do território rondoniense foi concluído no final da década de 1990.
Uma segunda aproximação foi definida pela Lei nº 233/2000, que recebeu o pomposo designativo de Lei do Zoneamento Socioeconômico-Ecológico do Estado de Rondônia.
Como ocorreu na maioria dos estados amazônicos, a elaboração e aprovação de legislação para instituição do zoneamento em pouco alterou o rumo dos acontecimentos. Ocorre que as regiões com melhores condições de logística, sobretudo por sua proximidade com rodovias pavimentadas que possibilitam o escoamento da produção, foram, de imediato, entregues à exploração pelo agronegócio.
E outras áreas que mais tarde se tornariam acessíveis ficaram, de certa forma, reservadas, à espera de futuras revisões – que foram chamadas de “aproximações”. Quer dizer, aproximar o zoneamento da realidade equivaleria a permitir o uso pelo agronegócio de novas áreas, antes sem acesso rodoviário.
Não deve haver expectativa em Rondônia de que, nas terras atualmente entregues ao agronegócio e que representam mais de 80% do total de área desmatada, ocorrerá um processo natural de sucessão florestal até o surgimento duma nova floresta, semelhante à que foi desmatada há mais de 40 anos.
Essa utopia ambientalista pode ser descartada: a área de floresta nativa desmatada durante a consolidação do agronegócio, na melhor das hipóteses, vai ser destinada às florestas plantadas – como as de eucalipto, por exemplo.
Por outro lado, a possibilidade de ampliação do perímetro ocupado pelas unidades de conservação parece ser igualmente utópica. Num estudo recente sobre o desmatamento ocorrido nessas áreas protegidas – que foram instituídas, esclareça-se, justamente para evitar a indesejável prática – das 5 unidades de conservação mais desmatadas da Amazônia, 3 estão localizadas em Rondônia.
Mas, afinal, o que podem esperar os rondonienses dos resultados da COP 21, a reunião da ONU que acontecerá em Paris, França, em dezembro próximo e na qual será negociado um novo acordo climático global?
Ou o agronegócio continua seu inexorável processo de consolidação, ou o desmatamento será, enfim, banido em Rondônia. Não existe terceira via.


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

Expectativas amazônidas para a COP 21

* Ecio Rodrigues
É uma pena, mas a região que abriga a maior floresta tropical do mundo, a Amazônia, dispõe de uma representação política que vislumbra exclusivamente um futuro baseado na agropecuária – vale dizer, um futuro que prescinde, que abre mão da maior floresta tropical do mundo.
Obcecados pela criação de gado, os políticos amazônidas, sem exceção e, o pior, sem diferenciação entre os partidos que permanecem por longos períodos no poder regional, enxergam a região como o “celeiro do mundo” – continuam retumbando o equivocado conceito que aprenderam lá atrás, com a dedicada professorinha do ensino fundamental.
Superar essa etapa do processo de desenvolvimento da Amazônia tem sido difícil, se não impossível. Por mais que as evidências reiteradamente comprovem a inviabilidade de qualquer atividade que pressuponha uma ocupação produtiva baseada no desmatamento, a persistência da insensatez impressiona.
Além dos documentos oficiais, oriundos de organismos internacionais de financiamento, como o Banco Mundial e o Banco Interamericano (para ficar nos  mais requisitados pelos governos locais), há um sem-número de estudos, publicados tanto por peritos nacionais quanto por estrangeiros, demonstrando o que deveria ser uma verdade indiscutível: a pecuária não serve para a Amazônia. Simples assim.
Por outro lado, existe ainda mais um argumento, muito eloquente, aliás, e que deveria ser suficiente para convencer os amazônidas de que um modelo de desenvolvimento ancorado na floresta precisa ser consensuado, elaborado e levado a efeito, imediatamente.
Ocorre que o mundo não aceita mais o desmatamento de florestas na Amazônia. Isso é fato. E não adianta partir para os costumeiros arroubos de soberania nem tampouco recorrer a duvidosos sensos de oportunidade – como o que advoga que a renúncia ao desmatamento ensejaria indenização pecuniária, algo quase abominável. A tendência é de recrudescimento, a ponto de começar-se a exigir a restauração florestal das porções de mata ciliar.
Talvez seja essa a maior expectativa sobre os resultados das negociações que deverão ocorrer durante a 21ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, COP 21 da sigla em inglês, que será realizada a partir de 11 de dezembro de 2015 em Paris, França.
Afinal, os avanços são manifestos. Até o momento, 150 países protocolaram na ONU seus planos de redução de emissões de carbono, que englobam 90% do total de gases de efeito estufa lançados na atmosfera. Para se ter uma ideia do tamanho dessa adesão, o Protocolo de Kyoto, assinado em 1996 e que vai vigorar até 2020, prevê metas de redução em torno de 10% das emissões mundiais.
Não é necessário aprofundar-se na análise dos planos de redução das emissões de carbono para constatar que a diminuição do desmatamento na Amazônia e, a partir da COP 21, a restauração florestal da mata ciliar desmatada pela pecuária são questões-chave.
Significa afirmar que, mesmo sem querer e mesmo sob algum grau de teimosia e descuido, os amazônidas serão obrigados a assumir o que deveriam ter sido os primeiros a propor: tolerância zero para com o desmatamento – o legal e o ilegal, evidentemente.
Por sinal, será cada vez mais vexaminoso explicar mundo afora a existência de um “desmatamento legalizado”.

Para os que insistem no desmatamento, a expectativa é que a COP 21 demonstre o óbvio: a saída sempre esteve na conservação da floresta.   


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Produção de madeira manejada: única saída para Reservas Extrativistas


* Ecio Rodrigues
Pesquisadores e acadêmicos não costumam dizer “nunca”. Acham que o exercício da ciência sempre prevê um caminho alternativo e que é possível encontrar uma segunda ou terceira via para tudo, ou quase tudo. Esse entendimento, entretanto, não se aplica ao tema das Reservas Extrativistas localizadas em terra firme na Amazônia.
No caso dessas unidades de conservação, destinadas ao aproveitamento de recursos oriundos da diversidade biológica, ou da biodiversidade presente em terra firme, não há outra via: o manejo florestal voltado para produção de madeira é o único caminho, a única alternativa.
Um retrato sintomático dessa constatação é a Reserva Extrativista Chico Mendes, situada em Xapuri, no Acre. Considerada um ícone do movimento dos seringueiros, por se tratar do local onde nasceu o líder que lhe emprestou o nome, essa foi uma das primeiras áreas a ser reivindicada, pelos próprios seringueiros, para a criação de uma Reserva Extrativista.
Sob custos elevados, a sociedade brasileira aceitou desapropriar quase um milhão de hectares de terras cobertas por florestas, e entregar o seu usufruto aos extrativistas que há gerações ali habitavam – aos quais foi imposta a condição de não desmatar além dos limites estabelecidos para o cultivo de produtos de subsistência (arroz, feijão, milho, maniva), ou seja, destinados ao consumo da própria família.
À imensa porção de florestas restava a exploração por meio da tecnologia do manejo florestal de uso múltiplo. O seringueiro poderia se qualificar como manejador florestal e ganhar dinheiro – saindo da condição de penúria que sempre lhe caracterizou– mediante a produção de borracha, castanha-do-brasil, copaíba, carne de animal silvestre, sementes florestais – e também de madeira, a imprescindível madeira.
Não é preciso grande esforço para perceber que, dos produtos relacionados, a madeira é o mais lucrativo, o que apresenta maior liquidez e maior facilidade de acesso aos mercados.
O fato é que o manejador florestal residente numa reserva extrativista não consegue manejar e vender carne de paca, queixada, capivara ou de qualquer outro animal silvestre. Também não consegue coletar e vender sementes de mogno, cedro, cerejeira ou de qualquer outra árvore. Pior ainda, não consegue extrair e vender óleo de copaíba, leite de jatobá ou qualquer outro fitoterápico oriundo de espécies florestais.
No âmbito desses três produtos – animais silvestres, sementes e fitoterápicos – o órgão público gestor das Reservas Extrativistas, conhecido pelo sofrível acrônimo ICMBio, impõe uma série de restrições para impedir o manejo florestal e a produção sustentável. Cria, por mais insano que pareça, mais dificuldade para o manejo florestal do que para a criação de boi.
E aí se chega à inevitável conclusão de que a produção comunitária de madeira é, na conjuntura atual, a única saída para as Reservas Extrativistas.
Ocorre que, embora o manejo para produção de madeira também enfrente inúmeros embaraços impostos pelos órgãos de controle, trata-se de um produto com cadeia produtiva consolidada. Assim, a demanda do mercado pela madeira empurra o produtor para o seu manejo. E a despeito dos melindres dos analistas ambientais do ICMBio, que torcem o nariz a cada caminhão toreiro que cruza a Reserva Extrativista, a força de mercado se impõe.
Por sinal, como bem sabem os que vivenciam a realidade da produção florestal comunitária na Amazônia, quando não maneja, o produtor acaba por vender a madeira de qualquer jeito. Esse é, sem dúvida, o pior dos mundos.
Choradeiras à parte, manejar madeira é bom para a floresta e para o manejador. Por isso, a madeira é a única alternativa ao boi na Reserva Extrativista. 


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília. 

Metas ousadas para a COP 21? Nem tanto


* Ecio Rodrigues
Consideradas ousadas até por ambientalistas, as metas que o Brasil apresentará para negociação no âmbito da 21ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima são, no máximo, provocativas. 
Para explicar melhor. Todas as 196 nações associadas ao sistema ONU devem apresentar e negociar, na COP 21 – a ser realizada em dezembro em Paris, França –, metas para redução de seus níveis de produção de carbono.
Duas datas são importantes na negociação. A primeira assinala o ano de 1992, quando foi assinada a Convenção sobre Mudanças no Clima (durante a Rio 92), e estabelecidos os níveis de referência para a produção de carbono. A segunda define 2030 como prazo-limite para que os países cumpram suas metas, antes que as tragédias climáticas se tornem irremediáveis, e o equilíbrio do planeta entre em colapso.
Resumindo, significa que cada país deve determinar, em números, a quantidade de carbono que deixará de jogar na atmosfera até 2030, tendo como referência o que produzia em 1992.
Uma parte da ousadia brasileira, comemorada por ambientalistas nativos e estrangeiros, atém-se à quantificação. Provavelmente, o país é um dos primeiros, se não o primeiro país em desenvolvimento, a traduzir em números o que pretende fazer para contribuir com a redução das emissões de carbono.
Outra parte da ousadia, igualmente festejada, alude, por sua vez, ao volume da redução pretendida, estipulada em 37% da produção de gases de efeito estufa até 2025, e em 43% até 2030. Números expressivos, sem dúvida – tão expressivos que exigem maior prudência em sua análise.
Ocorre que uma das principais medidas para alcançar esses números diz respeito ao fim do desmatamento ilegal na Amazônia. Essa proposta, aparentemente audaciosa, embute na verdade duas constatações bastante inconvenientes: o desmatamento legal nunca será zerado; e o cerrado continuará dando lugar à soja e ao boi.
Sempre é bom reforçar que a meta se reporta ao desmatamento ilegal, aquele que contraria a legislação nacional há mais de 50 anos – no mínimo desde a aprovação do Código Florestal de 1965. Ao apontar o ano de 2030 como prazo para o fim do desmatamento ilegal, o Estado brasileiro está efetivamente assumindo que a ilegalidade será admitida por mais 15 anos, para só então vir a ser suprimida.
Outra medida essencial para o país cumprir o compromisso assumido na ONU contempla a ampliação do aproveitamento hidroelétrico, o que só pode ocorrer, claro, mediante a construção de novas hidrelétricas. Só no rio Tapajós, por exemplo, sete novas usinas previstas deverão ser licitadas, construídas e entrar em operação até 2030. Ora, se a construção da usina de Belo Monte já tem sido (equivocadamente, diga-se) duramente contestada pelos ambientalistas, o que dizer de outras tantas?
Finalmente, como terceira medida para reduzir sua produção de carbono, o Brasil se propõe a recuperar 15 milhões de hectares de pastagens degradadas, no intuito de tornar essas áreas novamente produtivas e aumentar a criação de boi na Amazônia, sem desmate de novas florestas. Uma proposta que pode criar mais problemas que soluções.
A história econômica amazônica é farta em exemplos de políticas públicas voltadas para o aumento da produtividade da pecuária e que no final das contas ampliaram, em igual proporção, o desmatamento. O persistente aumento da taxa de desmatamento no Acre, enquanto se observa sua redução no restante da Amazônia, certamente é resultado desse tipo de diretriz.
Controvérsias à parte, aos que comemoraram as metas faz-se um importante alerta: ampliar o valor da floresta na Amazônia é, e sempre foi, a única saída.
Sendo um momento de decisão planetária, a COP 21 representa a oportunidade de os países avançarem na busca de uma economia que substitua o petróleo e amplie a área de florestas. Essa é a meta!          


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília. 

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

III Seminário Nacional do Bambu

Olá, leitores. Hoje venho compartilhar um evento que ocorrerá nos próximos dias 27 a 30 de Outubro em Goiânia - GO. O evento é o "III Seminário Nacional do Bambu".





Segundo pesquisas, o Acre possui a maior área coberta por taboca (bambu) nativa do país. Com predominância da espécie Guadua Weberbaueri, essa enorme área, que pode ser maior que 600 mil hectares, vem sendo estudada desde o final da década de 1980.
Um estudo pioneiro foi realizado pela Funtac, com recursos financeiros da ITTO, na Floresta Estadual do Antimary em 1988. Esse estudo, dirigido pelo Engenheiro Florestal Ecio Rodrigues, identificou, pela primeira vez, a espécie de taboca e testou seu potencial de uso para alimentação, álcool, celulose, carvão e na construção civil.
Todos os testes apresentaram bons resultados e nenhum desses usos, até o momento, se transformaram em empresa, emprego e renda.
Assim, o evento será um local de discussão sobre essa matéria-prima abundante e de uso difundido em regiões como a Ásia, sendo hoje uma das prioridades de estudos no Estado do Acre.

Congresso Florestal Mundial assevera: florestas são cruciais para o clima

* Ecio Rodrigues
Tendo contado com mais de quatro mil participantes oriundos de 142 diferentes países, o Congresso Florestal Mundial, encerrado em 11 de setembro último na África do Sul, destacou a relação cientificamente comprovada entre a conservação das florestas, o equilíbrio do clima e a redução da fome no mundo.
O congresso, que é realizado a cada seis anos e organizado pela FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), discutiu o papel da tecnologia do manejo florestal na produção de um leque de produtos e serviços oriundos do ecossistema florestal.
A ideia central, que pode ser facilmente assimilada no documento final aprovado pelos participantes – intitulado “Declaração de Durban”, numa referência à cidade onde aconteceram os debates – é que as formações florestais têm papel decisivo no equilíbrio do clima e no combate à fome.
No intuito de definir um cenário mundial para as florestas em 2050, o evento analisou o desflorestamento (ou perda de formações florestais) ocorrido no mundo desde 1990 – em contraposição ao surgimento de florestas plantadas.
O balanço correspondente ao período entre 1990 e 2015 é desalentador. As estatísticas indicam a perda de nada menos que 129 milhões de hectares de florestas, área equivalente ao tamanho do território da África do Sul, um dos países africanos de maior extensão. Nem precisa dizer que, principalmente em função dos altos índices de desmatamento observados na Amazônia, a participação brasileira nesse cenário é bastante acentuada.
A boa notícia é que os dados apontam tendência de queda no desmatamento em todo o mundo. Ainda de acordo com a FAO, enquanto na década de 1990 a taxa anual de desmatamento no mundo era de 0,18%, atualmente a perda de florestas encontra-se na faixa de 0,08% ao ano.
Outra conclusão significativa assumida pelos participantes diz respeito à adoção, em larga escala, das diretrizes do manejo florestal de uso múltiplo. O congresso reforçou o princípio de que o ecossistema florestal pode ser manejado para produzir alimentos, energia, água, e também para retirar carbono da atmosfera, melhorar a paisagem, disponibilizar áreas voltadas para recreação, atividades espirituais etc.
Trata-se de um rol quase inesgotável de produtos e serviços que apresentam dois atributos valorizados e priorizados pelo mundo contemporâneo: são sustentáveis e acessíveis às comunidades de baixa renda.
Significa dizer que as florestas podem garantir um conjunto de atividades econômicas que, em face de suas características intrínsecas, não exaurem o recurso florestal nem põem em risco de extinção espécies da flora e da fauna.
Por outro lado, o manejo das florestas para a oferta de múltiplos produtos e serviços não exige do pequeno produtor, em especial o que vive no interior da floresta, habilidades complexas e distantes da realidade vivenciada por sua família.
Pelo contrário. As experiências de manejo florestal comunitário direcionadas para a produção de madeira e de outros produtos florestais levadas a cabo na Amazônia e especialmente no Acre demonstram, sem deixar qualquer tipo de dúvida, o potencial dessa atividade na geração de renda sem pôr em risco o recurso florestal.
Levar as discussões do Congresso Florestal Mundial para a COP 21, conferência da ONU sobre mudanças climáticas que acontecerá em Paris, França, em dezembro próximo, certamente é prioridade para a FAO e para os participantes.
Afinal, na COP 21 os países aprovarão resoluções sobre o desmatamento e as florestas. Resoluções que podem mudar definitivamente a cena amazônica.  


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

Projeto Igarapé Santa Rosa em Xapuri conclui saneamento ambiental

* Ecio Rodrigues
Há mais de cinco anos, um conjunto de instituições – Oscip Andiroba, Engenharia Florestal da Universidade Federal do Acre, Instituto de Ciência e Tecnologia (Ifac - Campus Xapuri), Fundação Banco do Brasil, Prefeitura de Xapuri, Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Associação de Moradores do Bairro Bolívia, capitaneadas pelo Fundo Mundial para Vida Silvestre, o WWF da sigla em inglês – vem se concentrando no esforço de recuperar o Santa Rosa, igarapé localizado em Xapuri, no Estado do Acre.
Duas metodologias foram testadas – com sucesso, diga-se – para reverter as acentuadas condições de degradação verificadas naquele tributário do Rio Acre, que é considerado o principal canal de drenagem de águas pluviais em Xapuri.
Ocorre que, numa situação bastante comum nas cidades da Amazônia, sobretudo em capitais como Rio Branco, Manaus e Belém, o Santa Rosa sofreu com o processo irregular e não planejado de ocupação, tanto em seu trajeto urbano quanto rural: ao longo do igarapé, a criação de gado destruiu a mata ciliar na zona rural, e o esgoto sem tratamento comprometeu a qualidade da água na área urbana.
Na zona rural, em todas as propriedades cortadas pelo igarapé, é visível o desmatamento da mata ciliar e o adiantado processo erosivo do solo.
A solução encontrada pelos pesquisadores foi promover a restauração florestal da mata ciliar, o que melhora, de forma rápida, a vazão de cursos d’água comprometidos, possibilitando o resgate de seu equilíbrio hidrológico.
Dessa forma, deu-se início à Fase I do Projeto Igarapé Santa Rosa. Assumindo-se como referência a tecnologia concebida no âmbito do Ciliar Só-Rio Acre, projeto de pesquisa aprovado em edital do CNPq e executado pelos engenheiros florestais da Ufac, espécies nativas presentes na floresta xapuriense foram plantadas na faixa de mata ciliar do igarapé.
Mas, de nada adiantaria a restauração florestal da mata ciliar se o esgoto domiciliar despejado no Santa Rosa em seu trajeto urbano não passasse por tratamento sanitário. Esse foi o objetivo da Fase II do projeto – vale dizer, mediante a limpeza do esgoto doméstico, pretende-se promover uma redução drástica nos níveis de degradação observados na água que flui no leito do igarapé.
Por meio do emprego da “fossa séptica”, uma técnica simplificada de saneamento ambiental reconhecida pela Rede de Tecnologia Social, foi possível, com recursos financeiros oriundos da Fundação Banco do Brasil, atender 100% das residências localizadas na área de influência do Santa Rosa.
Com a instalação de um total de 270 fossas sépticas, todo o esgoto domiciliar despejado no igarapé começa a ser tratado de maneira simples e barata. Para se ter uma ideia, cada unidade domiciliar custa em média 800 reais, incluindo despesas com instalação.
Por sinal, a perícia adquirida pelos xapurienses na instalação dessa tecnologia é um dos expressivos ganhos da experiência, já que todos os trabalhadores foram contratados no próprio local. Ademais, os equipamentos e insumos necessários à instalação das fossas sépticas também foram negociados no município, o que permitiu lançar na economia de Xapuri, em 2015, cerca de 500 mil reais.
Em reunião com os envolvidos, realizada no Ifac de Xapuri com objetivo de discutir o término da instalação das fossas sépticas, os pesquisadores aventaram a realização de uma eventual Fase III, voltada para realizar monitoramento da água e do crescimento das espécies cultivadas na mata ciliar.
A conclusão dos partícipes é que a experiência não deve se restringir ao Santa Rosa, deve ser repetida em outras localidades. Afinal, numa região como a Amazônia, o que não falta é demanda para restauração de igarapés.


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

CPMF para saúde, educação e também para bancar campanhas de políticos?

* Ecio Rodrigues
De uma hora para outra todos se dizem contrários ao financiamento das campanhas políticas por empresas privadas. Pior, sob o argumento insano de que se não houver doação privada não haverá mais corrupção, defende-se o financiamento público das campanhas.
Os adeptos dessa tese se escudam em pesquisas de opinião que trazem resultados assustadores, indicando que mais de 70% dos brasileiros não querem que partidos políticos recebam doações de empresas privadas e, por conta disso, não são favoráveis ao financiamento das campanhas com o dinheiro oriundo dos impostos pagos por todos.
Exceção feita à mídia (que incorporou o discurso de que o financiamento privado das campanhas é a causa da corrupção), é difícil acreditar nesses resultados. Ao vincular doação de empresas (algo indiferente para a maioria) com o fim da corrupção (algo importante para todos), a pergunta feita aos entrevistados certamente foi equivocada ou, no mínimo, tendenciosa.
O problema é que, nas discussões sobre o tema travadas na imprensa, não se adverte que o financiamento público das campanhas está diretamente relacionado ao aumento de impostos, única alternativa para custear mais esse dispêndio a ser imposto à sociedade – ainda mais depois que o Executivo encaminhou ao Congresso uma previsão de orçamento pela qual o povo brasileiro já entra em 2016 devendo mais de 30 bilhões de reais.
Esse déficit será coberto mediante a instituição de um novo imposto – a CPMF que estão querendo ressuscitar – e/ou por meio do aumento dos vários tributos que integram a exorbitante carga tributária já suportada pela população brasileira.
Portanto, não são necessárias muitas operações aritméticas para perceber que qualquer despesa não prevista nesse orçamento deficitário aumentará ainda mais o rombo. É disso que se trata – da impossibilidade financeira de haver financiamento público das campanhas, sem que haja, necessariamente, aumento de impostos.
Sem nem entrar no mérito da irrelevância ética e moral dessa despesa, o fato é que não existe dinheiro público para cobri-la, e é quase impossível supor que o cidadão, cuja insatisfação com os políticos é mais do que evidente, está disposto a tirar mais dinheiro do bolso para bancar, de maneira integral, as campanhas de todos os candidatos – absolutamente todos os que concorrerem a cargos políticos, de vereador a presidente.
Diante da crise de credibilidade atual e da reiterada demanda por uma reforma política que não acontece, a pergunta é inevitável: o montante destinado aos partidos políticos por meio do Fundo Partidário não deveria ser suficiente?
Por sinal, poucas pessoas se dão conta – e a imprensa também não se dá ao trabalho de informar – que atualmente uma quantia considerável de dinheiro público já é direcionada ao caixa dos partidos políticos em atividade no país.
O Fundo Partidário, cuja dotação foi recentemente majorada pelo governo, irá distribuir entre os partidos em 2015 exatamente R$ 811.285.000,00 – ou seja, quase um bilhão de reais do dinheiro arrecadado dos contribuintes. Essa destinação se repete e se amplia todos os anos, há mais de 30 anos, desde que o fundo foi criado.
Talvez esteja aí o ponto que merece ser discutido com maior profundidade. Afinal, da mesma forma que é inegável a importância dos partidos políticos para a democracia e para a organização do sistema eleitoral, é inegável que a existência de 36 partidos (número alcançado depois da criação do Partido Rede Sustentabilidade, do Partido da Mulher Brasileira e do Partido Novo, todos registrados em 2015) demonstra que a organização de um partido político se transformou num bom negócio.
Um bom negócio mantido com recursos públicos do Fundo Partidário, que vai ficar melhor ainda se puder contar com o financiamento público das campanhas.


* Professor Associado da Universidade Federal do Acre, engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.