domingo, 17 de junho de 2012

Rio + 20 não pode acabar em samba e feijoada

* Ecio Rodrigues

As expectativas não atendidas nas Conferências das Partes (COP) - em especial as recentes COP 10 e COP 17 - estão sendo canalizadas para a Rio + 20. Espera-se que os países reunidos no Rio tenham condições de avançar no sentido de pôr em prática os propósitos daqueles importantes eventos, realizados no âmbito da Convenção do Clima e da Diversidade Biológica.
Conquanto vez ou outra surja um afobado dizendo que o planeta vai resfriar, e não esquentar, há um consenso, hoje – no que se refere às Mudanças Climáticas -, quanto à comprovação científica das alterações que vêm ocorrendo no clima, decorrentes do modelo de desenvolvimento adotado no planeta.
Ou seja, não vem ao caso se vamos morrer queimados ou congelados. O problema é que, mantido o ritmo de crescimento econômico mundial, é grande o risco de acontecerem tragédias planetárias - e isso, com certeza, vem ao caso.
Depois do reconhecimento de que as mudanças do clima são uma verdade científica, as nações se voltam para a imposição de regras que mitiguem o risco de tragédia. Regras que assumem dois rumos distintos e correlatos. O primeiro diz respeito à redução do uso de combustíveis fósseis (leia-se petróleo); e o segundo, ao estabelecimento de mecanismos voltados para o favorecimento de um novo ciclo econômico, denominado de Economia de Baixo Carbono.
Já em relação à Diversidade Biológica, há o consenso de que a ampliação da área de ecossistemas naturais sob proteção legal é a maior garantia de conservação da biodiversidade. Com metas definidas até 2020, os países terão que criar mais Unidades de Conservação, e, o mais importante, fazer com que essas áreas protegidas funcionem de fato.
Ou seja, embora seja importante a criação de novas reservas extrativistas, parques nacionais, florestas nacionais e outras categorias de unidades de conservação, não adianta a sociedade assumir o elevado custo relativo ao assentamento dessas unidades, se elas não desempenharem um papel preponderante naquele novo sistema econômico, não baseado no carbono.
A título de exemplo, pode-se dizer que os benefícios advindos com a instalação de reservas extrativistas não serão alcançados, se a população tradicional que reside em seu interior mantiver a pecuária como principal atividade produtiva.
Portanto, um dos resultados esperados da Rio + 20 é a adoção de medidas que visem introduzir as áreas legalmente protegidas na nova economia de baixo carbono. Para o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, Ipea, órgão público vinculado à Secretaria de Assuntos Estratégicos, os denominados serviços ecossistêmicos prestados por essas áreas pode chegar a 10 bilhões de reais anuais.
Por outro lado, deverá também dominar boa parte da Conferência a discussão sobre metas precisas para a redução das emissões de carbono, bem como de outros elementos químicos presentes na fumaça que se joga na atmosfera.
Enfim, tudo o que, até agora, não se conseguiu avançar em relação ao clima e à biodiversidade precisa ter uma resposta mais consistente dos governantes no Rio. Um lugar, por sinal, que é célebre por seu contexto – digamos assim – de samba, mulata e feijoada.
Diversos setores da sociedade - no Brasil, e mundo afora - estão registrando suas reivindicações em cartas, a serem entregues aos dirigentes no decorrer da reunião. Pelo menos um pedido é reiterado em todas elas: a consumação de ações mais eficazes para a mitigação das mudanças climáticas e para a conservação da biodiversidade.
Será um perigo, para a humanidade, se os países reunidos no Rio não lograrem instituir novas regras que garantam um futuro com sustentabilidade. A próxima oportunidade pode ser só daqui a 20 anos. 

* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Rio + 20, Código Florestal e Amazônia

* Ecio Rodrigues
Parafraseando-se Shakespeare, algo de incoerente (para não dizer podre), acontece no reino. Fácil de entender. Para o discurso da Conferencia Rio + 20, vale a cantilena de que o país possui uma das maiores áreas de florestas do mundo; mas, para efeito de aprovação do novo Código Florestal, vale a máxima de que a importância econômica do agronegócio justifica a ampliação da área plantada nas margens dos rios e igarapés.
E a Amazônia não vai bem, e pode ficar pior, muito obrigado.
É possível que ninguém tenha se dado conta disso, mas se as discussões em torno das alterações no projeto do novo Código Florestal tivessem sido concluídas até 2010, a habitual incongruência tupiniquim passaria despercebida.
A despeito de o país ter se sobressaído durante a Rio 92, a segunda Conferência da Organização das Nações sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (a primeira aconteceu em Estocolmo, em 1972), na condição de referência no quesito preocupação ambiental, de lá (1992) prá cá (2012), a distancia entre o discurso internacional e as ações internas tem assumido proporções, que, para dizer pouco, beiram o disparate.
Enquanto se assume, perante as outras nações, que se investe no controle do desmatamento, a fim de garantir a manutenção das florestas (sobretudo na Amazônia), discute-se um Código Florestal de orientação francamente desfavorável à conservação de áreas florestais.
Sem entrar no mérito do conteúdo do veto presidencial (ao projeto aprovado pela Câmara) e da Medida Provisória (pela qual o governo tenta retomar o projeto aprovado no Senado), o fato é que essa balbúrdia legislativa, essa bagunça de procedimentos só evidencia ainda mais o que já se sabia: que a preocupação com o destino da Amazônia e das nossas florestas é bem menor do que a preocupação com o agronegócio.
E as previsões são, no mínimo, inquietantes. Pois que, no frigir dos ovos, os ruralistas vão conseguindo tudo o que pretendiam - anistia, impunidade, e mais: a prerrogativa de invasão da mata ciliar, comprometendo a água que abastece a área urbana, e a anexação de uma expressiva quantidade de hectares, antes cobertos pelas florestas existentes nas áreas de reserva legal.
A verdade é que, enquanto o Governo se fez de refém para aprovar a venda de álcool nos estádios - o que (com toda a razão) a poderosa Fifa não quis nem discutir -, os ruralistas demonstraram a sua força, tanto na esfera da Câmara dos Deputados, quanto na do Senado. Mas, antes de tudo, o que esse setor demonstrou mesmo foi uma grande leviandade em relação às graves implicações ambientais advindas de sua respectiva atividade produtiva.
Não obstante (já que isso não depende apenas do Brasil), não lograrão convencer o mercado internacional de que a carne de boi ou os grãos de soja que produzem não trazem comprometimento para a qualidade e a quantidade de água, não aumentam a poluição do ar, ou não ampliam o desmatamento. Diferentemente do que acontece com o Congresso Nacional, esse mercado está atento às questões ambientais, e seguramente será influenciado pelas discussões e deliberações que resultarão da Rio + 20.
Resta saber, portanto, que postura política o país assumirá durante a Rio + 20, prevista para junho.
Na Rio + 20 não haverá espaço para a defesa de pontos de vista como o que prevalece nas discussões sobre as propostas de no novo Código Florestal, contrárias à tendência internacional que aponta para a consolidação de uma economia de baixo carbono.
Tendência essa que, diante da iminente crise ecológica, vem se fortalecendo cada vez mais.

* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).