* Ecio Rodrigues
A transformação do extrativista, na condição de ator social e econômico, em manejador florestal é, ao mesmo tempo, a saída para o extrativismo e para a conservação da floresta na Amazônia. Todavia, a concretização dessa transformação irá requerer um grande esforço na qualificação do produtor.
Diga-se que nos últimos 20 anos, o extrativista, que se acostumara à completa ausência das instituições públicas e estatais, tem sido beneficiado com serviços que incluem desde o fornecimento de documentos elementares, como registro de identidade e certidão de casamento, até treinamentos mais sofisticados, como a habilitação em alguma inovação relacionada à produção de borracha.
Esses treinamentos, não obstante, são sempre de curta duração e direcionados para um fim específico. Trata-se de eventos que ocorrem de acordo com as demandas da fonte financiadora e da instituição responsável por sua execução, quase sempre uma organização da sociedade civil.
É necessário, portanto, o desenvolvimento de programas de qualificação planejados, de média ou longa duração, que envolvam, em seu conteúdo programático, além de uma discussão sobre a tecnologia do manejo florestal comunitário e o procedimento de licenciamento ambiental, o detalhamento de alternativas produtivas concretas para o produtor – por exemplo, a criação de paca (Agouti paca) em sistema agrosilvopastoril, e a coleta e beneficiamento de sementes florestais, para fins de venda nos mercados de mudas, e para a fabricação de peças de decoração e bijuterias.
Experiências levadas a cabo por organizações da sociedade civil demonstram que a qualificação para o manejo florestal comunitário traz resultados surpreendentes. Além da possiblidade de elevação do nível de renda do produtor, a qualificação em manejo florestal induz o extrativista a investir em atividades produtivas baseadas na diversidade biológica presente no ecossistema florestal, afastando-o do perigoso e nefasto universo da pecuária bovina.
Ao final desses cursos, os extrativistas costumam demonstrar grande interesse nesse tipo de alternativa econômica – ainda que alguns manifestem receio de enfrentar o processo de licenciamento ambiental, por considerarem as regras excessivas e por já terem tido alguma experiência negativa relacionada à fiscalização ambiental, notadamente a efetuada pelo Ibama.
Mas, o mais importante é que todos os extrativistas ficam entusiasmados com a nova tecnologia e com o leque de opções produtivas que lhes traz a possibilidade de manter sua tradição extrativista no interior do ecossistema florestal.
A execução de um amplo programa de qualificação do extrativista para o manejo florestal comunitário certamente apresentará, como a experiência comprova, ganhos imediatos para um conjunto de atividades econômicas, em face das quais, hoje, não há geração de renda. Trata-se da introdução de novas opções produtivas, que vão melhorar a frágil dinâmica econômica local, atualmente ancorada na produção de arroz, feijão, milho e macaxeira.
Esse extenso programa de qualificação, voltado para disponibilizar as ferramentas do manejo florestal comunitário para o extrativista, deve ter caráter permanente e, mais que isso, deve organizar os atuais projetos de extensão florestal, indo além dos eventos temporários e desconectados que tomam o tempo do produtor e produzem resultados discutíveis.
Não há dúvida que está na qualificação do extrativista para o manejo florestal comunitário a saída mais barata, mais rápida, mais inclusiva e mais adequada aos ideais de sustentabilidade atualmente preconizados para a ocupação produtiva da Amazônia.
Trata-se de uma solução de simples implemento, mas que, pela falta de prioridade no âmbito da política pública, não acontece.
* Professor da Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).