segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Interação entre floresta e água na Estação Ecológica do Rio Acre

* Ecio Rodrigues

Não há dúvida científica acerca da estreita relação que existe entre as formações florestais e a quantidade e a qualidade da água que corre num rio.
Embora esse vínculo entre a água e a mata ciliar tenha sido desconsiderado durante as discussões que levaram à aprovação do Código Florestal, em 2012, e do decreto regulamentador do Cadastro Ambiental Rural, em 2014, os cientistas, por meio da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, não pouparam esforços para alertar que o equilíbrio hidrológico de um rio depende, em grande medida, do que ocorre na mata ciliar presente em suas margens.
O esmiuçamento desse estreito vínculo é prioridade, em especial na Amazônia. Parece claro que a região que abriga uma das maiores bacias hidrográficas e a maior formação de floresta tropical do planeta deve se aliar ao esforço científico para responder as questões que ainda instigam os pesquisadores.
Essas questões se relacionam, por exemplo, às espécies florestais que compõem as matas ciliares, e ao tipo de consórcio (entre essas espécies) mais adequado para a restauração florestal dos trechos degradados – a maior parte, diga-se, em decorrência da criação de gado.
Determinados a investigar a importância das florestas para os rios, pesquisadores vinculados à Engenharia Florestal da Universidade Federal do Acre lograram aprovar, no âmbito dos editais publicados pelo CNPq, dois projetos de pesquisa voltados para o estudo da mata ciliar dos rios Acre e Purus.
Os importantes resultados obtidos em ambos os projetos incluem a definição de metodologia padronizada para o inventário e mapeamento por satélite da mata ciliar dos rios que cortam o território do Acre. Também compreendem a concepção de um indicador, o denominado IVI-Mata Ciliar, que possibilita a especificação das espécies florestais a serem empregadas na restauração florestal das áreas desmatadas.
Essas experiências, por sua vez motivaram a criação do Grupo de Pesquisa Interação Água e Floresta na Amazônia. O grupo, cadastrado no CNPq, dedica-se a estudar a influência das formações florestais presentes na Estação Ecológica do Rio Acre no nível de turbidez e vazão da água que abastece os oito municípios situados à jusante da nascente do rio.
Dando continuidade às pesquisas, no período de 08 a 25 de outubro próximo, uma expedição terá lugar na estação ecológica, localizada na cabeceira do rio Acre, no município de Assis Brasil, na fronteira entre Brasil e Peru.
Contando com o apoio do ICMBio, a equipe de pesquisadores irá subir o rio, de Assis Brasil até a estação ecológica, a fim de concluir as medições iniciadas em 2012, quando a mesma expedição foi realizada no período das cheias. Agora, os níveis de vazão e turbidez do rio, além da biomassa presente na mata ciliar, serão mensurados durante a seca.
Outro objetivo da expedição será a instalação de 10 parcelas permanentes, cada uma com 20 X 130 metros. Durante os próximos 20 anos, essas parcelas serão monitoradas, visando-se a: aferir a dinâmica florestal da mata ciliar; medir o fluxo de sedimentos e de água que chega ao rio; quantificar a contribuição da estação ecológica para a qualidade e a quantidade da água que chega nos municípios à jusante; e, o mais importante, precificar o serviço ambiental que a estação ecológica presta, de melhoria na qualidade e vazão da água.
Espera-se que num futuro próximo as empresas distribuidoras de água para abastecimento urbano, as unidades de produção agropecuária e as demais indústrias que dependem da água do rio Acre paguem por esse serviço.
Os valores arrecadados irão custear o manejo da estação ecológica – que, dessa forma, poderá produzir água de melhor qualidade e em maior quantidade. Nada melhor que um ciclo econômico virtuoso.


* Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

TecFlorestal II - Segundo Encontro de Tecnologia Florestal no Acre

* Ecio Rodrigues

A cada dois anos os engenheiros florestais da Universidade Federal do Acre, Ufac, e os pesquisadores da Fundação de Tecnologia do Acre, Funtac, organizam o TecFlorestal. Motivação para analisar e discutir o conhecimento gerado sobre tecnologia de extração e uso das espécies florestais no Acre é o que não falta.
Além de oportunizar a divulgação de tecnologias, a série de eventos tem como objetivo promover discussões em torno do potencial de aproveitamento dos produtos oriundos da biodiversidade.
Em cada edição, uma determinada espécie presente no ecossistema florestal é escolhida, e os debates se voltam para as tecnologias disponíveis tanto para a exploração dessa espécie quanto para a obtenção de produtos com capacidade para gerar negócios.
Dessa forma, ao mesmo tempo em que se nivela o know how a respeito dessa espécie, contribui-se para a organização de programas de pesquisas direcionados ao surgimento, no estado, de um mercado estruturado no ecossistema florestal.
Em 2012, no primeiro evento da série, a matéria-prima em evidência foi a taboca, ou bambu, como preferem alguns. Naquela ocasião, não houve dúvida quanto ao significado do manejo florestal da espécie para o assentamento de negócios sustentáveis no estado.
Diante da grande repercussão alcançada com a taboca, agora, em 2014, o TecFlorestal II dará continuidade às discussões, que irão se concentrar em duas linhas distintas: a dispersão nativa da espécie em território estadual, e a amplitude do emprego da taboca em mercados como o do mobiliário e o da construção civil.
A ideia é que o manejo florestal da taboca possibilite, de forma permanente e sustentável, o fornecimento de matéria-prima para um segmento empresarial com enormes chances de consolidação no Acre.
Por outro lado, o aproveitamento da espécie se configura em mais um dos setores produtivos que podem vir a integrar um futuro cluster florestal – ou seja, um aglomerado econômico baseado na exploração da biodiversidade, e que, por sua vez, pode levar ao estabelecimento de uma economia florestal na região, em contraposição à nefasta expansão da atividade pecuária.
A primeira e crucial resposta já foi obtida: existe ocorrência nativa de taboca no ecossistema florestal do Acre. Trata-se de uma área estimada em mais de 600 mil hectares coberta por tabocais, localizada nos municípios de Assis Brasil e Sena Madureira. Todavia, a “mancha de taboca”, como ficou conhecida ainda na década de 1980 esse enorme povoamento florestal, foi pouco estudada, tanto no que se refere ao manejo florestal da espécie quanto ao seu emprego.
As pesquisas realizadas em âmbito internacional e nacional (especialmente em São Paulo) confirmam o bambu como matéria-prima preferencial para aplicações em ramos tão díspares quanto o da indústria alimentícia e o da produção de papel e celulose, sem falar do poderoso, crescente e alvissareiro segmento econômico dos biocombustíveis.
Decerto que a domesticação de espécies florestais acarretou prejuízos para a Amazônia; sem embargo, se existe ocorrência nativa, a pesquisa em manejo florestal, objetivando-se a exploração sustentável da respectiva espécie, deve ser assumida como prioridade. Foi o que ocorreu no caso da borracha, da castanha-do-brasil, do cacau e drogas do sertão, da pupunha, da pimenta-longa; e não poderá ser diferente no caso da taboca.
O TecFlorestal II acontece de 22 a 26 de setembro, na Ufac. Todos lá!
Afinal, o uso econômico da biodiversidade, seja com a taboca, com a paca, com a madeira, ou qualquer outro produto florestal, é a única saída para a manutenção da floresta.


* Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

FUNTAC e Engenharia Florestal da Ufac realizam TecFlorestal II

A cada dois anos, os engenheiros florestais da Universidade Federal do Acre e os pesquisadores da Fundação de Tecnologia do Acre, FUNTAC, organizam o TecFlorestal.
Em 2012, no primeiro evento da série foi possível iniciar a discussão acerca do aproveitamento de um produto florestal especial para a realidade do ecossistema florestal no Acre: a taboca ou bambu.
O TecFlorestal II, por sua vez, irá dar continuidade à discussão acerca do emprego da taboca na construção civil, na confecção de mobiliário e, talvez o mais importante, no manejo florestal dessa espécie.
A ideia é que o manejo florestal da taboca possibilite o fornecimento de matéria-prima, de forma permanente, para um segmento empresarial com enormes chances de consolidação no Acre.
Ocorre que a mancha de taboca, como ficou conhecida ainda na década de 1980 a imensa porção de florestas estimada em mais de 600 mil hectares cobertas por taboca e localizadas nos municípios de Assis Brasil e Sena Madureira, foi pouco estudada tanto no que se refere ao seu manejo florestal quanto na sua aplicação.
O TecFlorestal II vai ajudar a nivelar o conhecimento sobre o bambu e a taboca e contribuir para organizar um promissor programa de pesquisas voltado a consolidação de um negócio sustentável em torno do ecossistema florestal no Acre.
Todos lá, de 22 a 26 de setembro na Ufac.
Imperdível.


segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Repiquete do desmatamento na Amazônia pode ser tendência

* Ecio Rodrigues

Sob um extraordinário esforço do aparato de fiscalização, o que exige um dispêndio financeiro proibitivo para as frágeis economias estaduais, certamente é possível derrubar as taxas de desmatamento na Amazônia.
Não obstante, o que mantém as taxas baixas é a política pública. Ligeira análise da curva do desmatamento na Amazônia, desde o início da medição em 1988, permite confirmar com certa facilidade essa assertiva. O ciclo de elevação e decréscimo da intensidade do desmatamento é recorrente, com recordes assustadores em 1995 e 2004, quando mais de 27.000 Km2 foram transformados (a maior parte) em pastos.
O momento atual parece ser semelhante e, ao mesmo tempo, muito preocupante. Depois que uma redução inédita foi comemorada em 2012, quando pela primeira vez o desmatamento atingiu uma área inferior a 5.000 Km2, já no ano seguinte houve um acréscimo de 29%; agora, de acordo com dados preliminares já divulgados, de agosto a julho de 2014 houve ampliação superior a 28% em relação ao aumento de 2013.
Os números demonstram que o repiquete do desmatamento nos últimos dois anos é um fato. E embora seja cedo para apontar as razões que expliquem o surgimento de um novo e trágico ciclo de destruição das florestas amazônicas, pelo menos três versões devem surgir: a dos governos, a dos ambientalistas e a dos pecuaristas.
Alguns pontos, contudo, devem ser esclarecidos.
Em primeiro lugar, as discussões que levaram à aprovação do novo Código Florestal em 2012 expuseram a fragilidade do sistema político bicameral e da relação deste com o Poder Executivo. Num vai e vem sem precedentes, o Código transitou entre o Senado e a Câmara, e entre as duas casas e a Presidência da República, sem que se solucionassem as inconsistências presentes no projeto e que permaneceram na lei aprovada.
A maior parte das polêmicas envolveu dois tipos especiais de florestas, as Reservas Legais e as Áreas de Preservação Permanente, cuja manutenção é imposta às propriedades privadas. Além de confundir conceitualmente essas duas formações florestais, o Código Florestal reduziu, de forma drástica, a quantidade de florestas que deveriam ser mantidas nas margens dos fluxos d’água.
Essa redução põe em risco a quantidade e a qualidade da água que abastece, por exemplo, os reservatórios de hidrelétricas e as áreas urbanas. Ou seja, para garantir um pouco mais de solo para a agropecuária, cometeu-se a imprudência de se desprezar a constatação científica quanto à estreita interação que existe entre água e florestas.
Por outro lado, não pode ser desconsiderado que o atual repiquete do desmatamento apresenta uma dinâmica nova e alarmante. Mais de 80% das florestas desmatadas são áreas inferiores a 20 hectares e estão localizadas em pequenas propriedades. Ao observar-se a distribuição espacial dessas áreas, nota-se que elas se afastam das rodovias, avançando sobre as margens dos rios.
Ainda não dá para saber se essa dinâmica tem ou não vinculação direta com o novo Código Florestal. Os resultados obtidos com a efetivação do Cadastro Ambiental Rural, que levou a eternidade de dois anos para ser regulamentado, poderá esclarecer essa questão no próximo ano.
O Acre surge com destaque no repiquete do desmatamento. Os municípios de Tarauacá e Cruzeiro do Sul, incluídos na lista dos que mais desmataram em julho último, são retratos da nova dinâmica, representada pela presença expressiva da pequena propriedade e do eixo dos rios. Pode ser que a contribuição do Acre nesse novo e perigoso quadro nada tenha a ver com a extinção da Secretaria de Florestas. Pode ser que tenha.
Uma coisa é certa, só uma política pública que atente para o valor da floresta manterá o desmatamento na Amazônia num nível aceitável pelo mundo.


* Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Concurso público para Chefe de Unidade de Conservação

* Ecio Rodrigues

Com a promulgação da Lei 9.985/2000 e do Decreto 4.340/2002 (que a regulamentou) estruturou-se, no Brasil, o complexo processo de criação e gestão das unidades de conservação. Complexo, em face, primeiro, das peculiaridades que caracterizam os ecossistemas existentes em território nacional, e segundo, da tentativa (frustrada, diga-se) de organizar as áreas representativas desses ecossistemas num sistema nacional, unificado e integrado.
Além de dispor sobre a criação das unidades de conservação, a norma legal também estabeleceu procedimentos para a gestão dessas áreas no período pós-criação. Dois desses procedimentos são cruciais: a elaboração do Plano de Manejo e a nomeação do Chefe da Unidade de Conservação, UC.
Para simplificar, o Plano de Manejo dita as regras de uso e gerenciamento da área; o Chefe da UC tem a responsabilidade de levar a efeito essas regras. Como acontece em qualquer empreendimento, um gerenciamento eficiente depende de regras claras (por isso o Plano de Manejo deve ser elaborado por profissionais habilitados) e de um bom capataz (por isso o Chefe da UC deve possuir formação em Planejamento e Gestão de Processos).
Deixando o assunto do Plano de Manejo para outro momento, a atuação do Chefe da UC, seja no caso das unidades incluídas no grupo de Proteção Integral, seja no caso das pertencentes ao grupo de Uso Sustentável, é sintomática em relação ao bom ou mau funcionamento dessas áreas.
Muitos defendem a tese, inclusive, de que as UCs precisam ser geridas como prestadoras de serviços ecossistêmicos, com possibilidade de arrecadar e gerir seu próprio orçamento. Nesse caso, o perfil do Chefe da UC teria que compreender também qualificação em Negócios nas áreas ambiental e florestal.
Todavia, a despeito de o exercício da função exigir formação específica, trata-se de um cargo de livre nomeação; ou seja, pode ser ocupado por qualquer pessoa nomeada pelo presidente do órgão estatal responsável pela UC (como o ICMBio, para as UCs federais). Assim, fica a critério do gestor nomear um funcionário público de carreira do próprio órgão ou acolher indicações efetuadas por grupos políticos locais, lideranças comunitárias, e assim por diante.
Não se questiona os avanços trazidos com a criação do ICMBio. O Ibama, órgão federal responsável pela gestão das UCs antes de 2007, não demonstrou, em toda a sua história, nem fôlego nem disposição para ir além das duvidosas ações de fiscalização. Sob a gestão do Ibama, as unidades de conservação só entravam na agenda do órgão no momento da assinatura do decreto de criação.
Não obstante, mesmo sob o comando do ICMBio, são raras as UCs que lograram êxito em cumprir os objetivos que justificaram o investimento público na sua criação. Por outro lado, são frequentes as situações em que essas áreas são confiadas a pessoas que, a despeito de suas boas intenções, não têm a habilitação necessária para gerenciar a UC, executando as decisões dimanadas dos conselhos consultivos e deliberativos.
A realização de concurso público para o exercício da função de Chefe de Unidade de Conservação, exigindo-se formação especifica em Engenharia Florestal, por exemplo, parece ser medida indispensável para outorgar efetividade à Lei 9.985/2000 e conferir eficiência às UCs. Mas o ICMBio ainda vai demorar para se dar conta disso.
As unidades de conservação, para alcançarem resultados, precisam de Plano de Manejo, de autonomia financeira e de orçamento especificado e imune a contingenciamentos.
Mas, antes de tudo, precisam ser gerenciadas de modo profissional por chefes qualificados, com capacidade técnica para tomar decisões operacionais e levar a cabo as ações previstas no Plano de Manejo da UC.

* Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Sem Plano de Manejo, a unidade de conservação fica sem rumo

* Ecio Rodrigues

Com a aprovação da Lei 9.985/2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, SNUC, tornou-se obrigatória a elaboração do Plano de Manejo para orientar o gerenciamento dessas áreas.
A norma legal estabelece o prazo de cinco anos, contados a partir da criação da unidade de conservação, para a elaboração do Plano de Manejo pelo órgão responsável, como meio de “promover a sua integração [da UC] à vida econômica e social das comunidades vizinhas”.
Há que ser dito, antes de tudo, que esse prazo é muito longo. Contraria o bom senso uma espera de cinco anos para que a UC dê início à execução do Plano de Manejo e, desse modo, tenha condições de atender aos objetivos que justificaram o investimento da sociedade na sua criação.
A despeito de tal constatação, contudo, o que se verifica é que, em mais de 90% das situações o órgão gestor (como o ICMBio para as UCs federais) não consegue cumprir o prazo legal, e a UC fica à deriva.
Para piorar, quando o Plano de Manejo chega a ser elaborado (fora do prazo e a custos exorbitantes), geralmente o documento produzido não é satisfatório e precisa ser revisado. O inusitado é que o procedimento de revisão não tem prazo sequer para começar, quanto mais para acabar.
O que se observa é que existe um conjunto de embaraços que parecem insuperáveis e que impedem que o Plano de Manejo esteja pronto no momento em que se necessita dele, isto é, no período imediatamente posterior à criação da UC.
Além da confusão costumeira que se faz entre o Plano de Manejo da UC, que é uma exigência legal para licenciar a UC como um todo, e o Plano de Manejo das atividades produtivas, que é condição para o licenciamento de cada atividade econômica prevista no Plano de Manejo da UC, costuma-se esperar desse tipo de documento bem mais do que ele oferece.
O movimento ambientalista e os analistas dos órgãos gestores criam uma expectativa muito grande com relação ao Plano de Manejo, o que faz com que os requisitos estipulados para a aprovação desse documento sejam, em geral, exagerados.
Exige-se uma série de estudos, que vão da identificação de alguma espécie rara (uma determinada orquídea, por exemplo) ao inventário de pelo menos quatro grupos faunísticos (mastofauna, herpetofauna, avifauna e ictiofauna), o que eleva o custo da elaboração dos Planos de Manejo a montantes proibitivos, principalmente para as frágeis economias locais da Amazônia.
Por outro lado, nota-se uma considerável dificuldade, tanto no aspecto técnico quanto no político, para a particularização das questões que realmente devem ser objeto de estudo no Plano de Manejo da UC.
Dessa forma, pontos polêmicos – como a definição de zonas de produção e de zonas intangíveis no interior da UC; determinação da zona de amortecimento da UC, em face das divergências presentes na legislação vigente; e identificação de cenários de curto e longo prazo que ameacem ou promovam a UC – são precariamente analisados, dificultando o uso do Plano de Manejo como o instrumento de gerenciamento que ele deveria ser.
A conclusão é que, passados quase 15 anos da aprovação do Snuc, poucas UCs possuem Planos de Manejo finalizados, pouquíssimas conseguem elaborá-lo no prazo legal e quase nenhuma UC executa as prescrições contidas no documento, como evidenciou a auditoria do Tribunal de Contas da União realizada em 2013.
Sem Plano de Manejo, a unidade de conservação fica sem rumo, sujeita aos caprichos da Fiscalização. Que, como todo mundo sabe, não muda nenhuma realidade.

* Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.