segunda-feira, 23 de junho de 2014

Quase meio bilhão de reais doados às Unidades de Conservação da Amazônia

* Ecio Rodrigues

Para reforçar a máxima de que o problema não é a falta de dinheiro, mas os gravíssimos e insuperáveis entraves de gerenciamento, as unidades de conservação localizadas na Amazônia vão receber um vultoso montante da Cooperação Internacional. E o melhor, o dinheiro é doado, não precisa pagar.
Por meio do Programa Áreas Protegidas da Amazônia, conhecido pelo sofrível acrônimo Arpa, o Banco Mundial, o governo da Alemanha e o Fundo Mundial para Vida Selvagem, WWF, firmaram, em maio de 2014, um acordo para disponibilizar – pelos próximos 25 anos – o equivalente a 477 milhões de reais, a serem aplicados na criação e estruturação de unidades de conservação na Amazônia.
Depois de esgotado esse prazo, o Estado brasileiro se comprometeu a assumir o custeio das ações de gerenciamento nessas áreas. Espera-se que esse não seja apenas mais um, entre os muitos compromissos que nos acostumamos a assinar distraidamente.
Diga-se que, muito embora cerca de 60 milhões de hectares sejam destinados às unidades de conservação na Amazônia, apenas 4% delas se encontram efetivamente implementadas e são geridas de forma eficiente.
Essa foi a preocupante conclusão de uma importante auditoria operacional realizada pelo Tribunal de Contas da União, TCU, cujo relatório foi aprovado em dezembro de 2013.
O problema é de gerenciamento, e o órgão responsável pela administração dessas áreas, o ICMBio, que herdou essa responsabilidade do Ibama, não tem demonstrado fôlego institucional e capacidade operacional para avançar nesse quesito.
Dessa forma, dos mais singelos (por exemplo, o abastecimento de veículos) aos mais complexos (como é o caso da promoção do manejo florestal), os entraves operacionais se acumulam e permanecem sem solução.
Considerando-se que, diante do acordo firmado com a Cooperação Internacional, os problemas financeiros foram definitivamente resolvidos, seria o momento de o órgão se debruçar sobre os problemas de gerenciamento.
Todavia, a experiência demonstra que esse é um caminho ignorado – tanto pelo ICMBio quanto pelo próprio Ministério do Meio Ambiente. Afinal de contas, o Arpa existe desde 2002.
Na primeira fase desse programa, foram investidos em torno de 284 milhões de reais em 95 unidades de conservação. Atualmente, o Arpa se encontra em sua segunda fase, que totalizará investimentos na ordem de 126 milhões de reais.
Ou seja, à época da auditoria do TCU, realizada em 2013, uma quantia superior a 400 milhões de reais já havia sido aplicada nas unidades de conservação na Amazônia, ao longo de dez anos, com retorno pífio. Não custa repetir, apenas 4% das UCs possuem uma gestão considerada eficiente pelos auditores do TCU.
É evidente que todo investimento realizado nas unidades de conservação, especialmente nas localizadas no bioma Amazônia, irá refletir de forma direta na redução do desmatamento e na consequente minimização dos riscos decorrentes da mudança climática.
E é evidente, do mesmo modo, que a solução dos gargalos gerenciais do ICMBio arrogaria a esse investimento efeito exponencialmente superior.
Não há dúvida de que as unidades de conservação na Amazônia se configuram em instrumento chave para a estratégia de manutenção da maior floresta tropical do planeta. Uma mera comparação entre os índices de desmatamento aferidos dentro dessas áreas e os mensurados fora delas é suficiente para a comprovação dessa tese.
Falta transformar essa importância ecológica e econômica em prioridade política para o Estado brasileiro; e isso, tudo indica, ainda vai demorar bastante.


* Professor da Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.

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