* Ecio Rodrigues
Um empreendedor chega, hoje, em 2013, à
Amazônia. Além de se deslumbrar com a paisagem e com o que Euclides da
Cunha chamou de “obra inacabada” – que a natureza não teve tempo de
terminar –, ele se empolga com as possibilidades de negócios que o rico
ecossistema oferece.
O empreendedor acessa a internet, pede ajuda
ao oráculo de pesquisas rápidas, e esbarra num universo de informações
que evidenciam que o potencial de negócios é real e depende,
especificamente, do grau de empreendedorismo da população e,
genericamente, do grau de disposição dos investidores.
Ele vai,
então, em busca das informações oficiais, aquelas oriundas dos órgãos
governamentais federais e estaduais (em algumas localidades, também dos
municipais), a respeito do desempenho econômico das atividades
produtivas baseadas no tal ecossistema amazônico – que é exuberante, não
se pode esquecer.
As respostas são mais que animadoras. Dos
órgãos de controle, ele obtém esclarecimentos sobre as facilidades para
licenciar o seu empreendimento, e dos órgãos de gestão de políticas
públicas, sobre oportunidades de incentivos fiscais. Finalmente, depois
de percorrer os órgãos de fomento, responsáveis pela oferta dos fatores
de produção (o que os economistas chamam de terra, capital e trabalho),
ele passa a ter certeza de que o seu negócio obterá todo o apoio
possível.
Diante de perspectivas tão alvissareiras, o nosso herói
resolve produzir carne de animais silvestres, e até se pergunta por que
ninguém fez isso antes.
Aqui termina o conto de fadas e começa a
realidade. Acontece que sempre que o Estado não sabe exatamente o que
deve ou não fazer no âmbito de determinado setor da economia,
empresários e trabalhadores pagam um preço muito caro pela indecisão
pública e pela estagnação econômica que essa indecisão causa. Tal
constatação se aplica a praticamente todas as atividades voltadas para a
exploração do ecossistema amazônico.
Na Amazônia, a dinâmica
econômica é caracterizada por uma letargia inusitada. Parece até que
tudo faz parte de um processo cultural que não tem solução, mas não é
nada disso. O problema sempre foi e continuará sendo, pelo menos no
médio prazo, a falta de competência do Estado para definir o caminho a
ser seguido na ocupação produtiva da região.
Voltando ao exemplo
da produção de carne de animais silvestres, trata-se de uma atividade
simples de instalar e de implemento igualmente fácil, todavia, os
agentes públicos não fazem ideia de como se comportar diante da
iniciativa do empreendedor.
Assim, no momento em que o
empresário resolve entrar nesse negócio, ele se depara com o pior de
dois mundos – com os obstáculos impostos ao estabelecimento de um
mercado legal, e com as dificuldades decorrentes do cerco ao mercado
ilegal. Vale dizer, como o Estado não consegue coibir o mercado ilegal,
direciona a sua estrutura para criar dificuldades absurdas, a fim de que
o mercado legal não se estabeleça.
O argumento costumeiro e
repetido como mantra – que fere o bom senso, mas que poucos têm coragem
de enfrentar – é o de que a consolidação do mercado legal, no qual a
carne é produzida com tecnologia de manejo e sob controle de qualidade
do produto, poderia encobrir a carne ilegal, oriunda do abate no
interior da floresta. Um raciocínio distorcido, para dizer o mínimo.
Basta retorquir que o abate na floresta é muito mais caro, e se tem
proliferado, é justamente porque o mercado legal não existe.
No
pior dos dois mundos, entre o mercado legal não consentido e o ilegal
ineficazmente coibido, não há saída para o empreendedor.
Só
então ele descobre a resposta para aquela pergunta que lhe intrigara, ou
seja, a razão pela qual não existem, na região, iniciativas já
consolidadas no seguimento da produção de carne de animais silvestres.
Mas aí será tarde.
* Professor da Universidade Federal
do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista em Manejo Florestal e
Mestre em Economia e Política Florestal pela Universidade Federal do
Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade
de Brasília (UnB).
Nenhum comentário:
Postar um comentário