* Ecio Rodrigues
A atuação das organizações
da sociedade civil, sobretudo a partir da década de 1990, certamente foi
decisiva tanto para a demonstração de que a alternativa florestal era possível no
âmbito comunitário quanto para a transformação dessa alternativa produtiva em assunto
de políticas públicas.
Ainda que não seja possível determinar
com exatidão as razões que levaram essas entidades a se envolver em experiências
produtivas inovadoras e, na maioria dos casos, de grande risco econômico,
alguns fatores podem ser elencados.
Em primeiro lugar, a
dimensão do impacto social causado pela expansão da agropecuária e suportado diretamente
pelas populações extrativistas; em segundo lugar, a redemocratização do país e,
por conseguinte, a reorganização da sociedade civil na Amazônia; em terceiro
lugar, a oferta de recursos públicos a fundo perdido para as comunidades extrativistas;
finalmente, em quarto lugar, a disposição dessas comunidades para correr riscos
no campo econômico.
Diga-se que, a despeito da
influência do ambientalismo ortodoxo e contrário à produção comunitária de
madeira – que durante a década de 1990 teve grande entrada no movimento dos
seringueiros –, as comunidades extrativistas, sempre que tiveram oportunidade
de decidir, optaram, sem pestanejar, pelo manejo florestal comunitário.
Um rol extenso de atores
sociais se envolveu no esforço de demonstrar a viabilidade do manejo de produtos
florestais. Uma variedade de instituições – de pesquisa, de representação, de apoio
técnico – experimentou e comprovou o potencial do manejo florestal para ofertar
madeira, óleos, fauna silvestre, entre outros produtos.
Claro que algumas
experiências chegaram mais longe que outras. No entanto, são inegáveis as
implicações políticas, sociais, ambientais e econômicas que todas elas produziram
durante a década de 1990. Como também é inegável que essas implicações, por sua
vez, contribuíram em pelo menos três aspectos fundamentais para a consolidação
da atividade florestal na Amazônia.
O primeiro deles diz
respeito à desmitificação da produção madeireira realizada na região. A imagem
de destruição causada pela exploração predatória de madeira até hoje cria
resistências à aceitação social dessa opção econômica, difundindo a crença de
que não seria possível uma produção madeireira sob níveis aceitáveis de impacto
ambiental.
Dissociar o manejo florestal
daquela exploração predatória, vinculada à instalação da pecuária, contribuiu
para diminuir o tabu que cerca a atividade, demonstrando sua adequação aos
ideais de sustentabilidade.
Mais importante ainda, com o
envolvimento, nas atividades de manejo florestal, de instituições de pesquisas,
de organizações da sociedade civil e de comunidades extrativistas, a produção de
madeira angariou lastro social.
Ao passar da condição de
atividade marginalizada – praticada sem respeito à legislação e à conservação
da floresta – à condição de atividade regulamentada e ancorada em procedimentos
de certificação, o manejo florestal para produção de madeira adquiriu status de
alternativa econômica.
Finalmente (e não menos
importante), o terceiro aspecto refere-se à demonstração, em especial para o produtor
extrativista, da viabilidade do uso múltiplo.
Ao ser levada para o
contexto do produtor que vive no interior da floresta, a atividade florestal
superaria grandes obstáculos impostos ao seu incremento. Argumentações acerca
da inviabilidade do manejo perderam a validade, diante da superioridade da
renda gerada pela produção de madeira em relação à renda gerada por sua
principal concorrente, a pecuária.
Sem as experiências de
manejo florestal comunitário para produção de madeira levadas a efeito nos anos
1990, o desmatamento hoje seria bem maior. Mas é preciso avançar, é preciso seguir
adiante.
* Professor associado da Universidade Federal do Acre,
engenheiro florestal, especialista em Manejo Florestal
e mestre em Política Florestal pela Universidade Federal do Paraná, e doutor em Desenvolvimento
Sustentável pela Universidade de Brasília.
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