* Ecio Rodrigues
É rara a possibilidade de juntarem-se
diversos tipos de atividades produtivas num mesmo território, sem que
haja algum tipo de conflito gerado pela competição dos produtores na
exploração dos recursos disponíveis. Essa possibilidade é ainda mais
rara quando as atividades produtivas são, por sua natureza, excludentes,
como no caso da pecuária e da atividade florestal.
Não há como
desenvolver a pecuária sem comprometer a atividade florestal, pelo
simples fato de que o recurso disponível (nesse caso, o solo) somente
será passível de uso pela pecuária se a cobertura florestal for
retirada. E como todo produtor sabe, terra ocupada pela pecuária não
vira floresta novamente – pelo menos nos 50 anos subsequentes. Ou seja,
não tem volta.
Embora exista a possibilidade da substituição do
capim por outro cultivo, que pode ser até de árvores, o ecossistema
florestal que existia não será regenerado no médio prazo. A rica
biodiversidade estará perdida e só poderá recuperar toda a sua
potencialidade no longo prazo, e desde que se invista nessa restauração,
algo impossível para o produtor.
Sendo assim, a decisão privada
de investir no desmatamento para o cultivo de capim ou de
cana-de-açúcar é praticamente definitiva.
Por outro lado, a
decisão privada de investimento é motivada por uma série de variáveis
que fazem com que, aos olhos do produtor, a agropecuária seja mais
atraente que qualquer outra atividade que se relacione com a exploração
de algum produto florestal.
Sem qualificar o produtor de bom ou
mau, de perdulário ou de aproveitador – um equívoco muito comum – as
variáveis que influenciam na decisão privada de investir poderão ser
alteradas se, e somente se, houver uma decisão política para isso.
A
crença técnica, que embalou uma geração de engenheiros de vários
matizes, mas especialmente os engenheiros florestais e os agrônomos, de
que a realização de um zoneamento, dito econômico e ecológico (uma
junção por sinal inusitada), poderia resolver a questão não se
concretizou para a realidade amazônica, justamente porque os estudos
técnicos carecem de decisão política para serem trazidos para a
realidade.
Ocorre que além de embutir certo grau de generalização
– uma vez que os levantamentos não afirmam categoricamente que tal
terra é boa para atividade florestal e não para pecuária, e, no máximo,
apontam as consequências que o desmatamento pode trazer para aquela
região – a alternativa técnica é sempre interpretada pela decisão
política.
A distribuição desordenada de unidades de conservação
no Acre, o estado amazônico que proporcionalmente possui maior área
ocupada por unidades de conservação, dá uma boa medida dessa
constatação. No Acre, criaram-se reservas extrativistas, florestas
nacionais etc. de maneira totalmente aleatória, sem que houvesse
qualquer tipo de planejamento para a localização dessas unidades em
território estadual.
Essa ausência de planejamento compromete o
gerenciamento das unidades de conservação, que terminam implicadas na
indecisão política entre a pecuária e a floresta. As unidades de uso
sustentável criadas no Acre, como as reservas extrativistas, florestas
nacionais e as florestas estaduais, ante suas características de
produção florestal (comunitária no primeiro caso e empresarial nas duas
últimas) deveriam fazer parte de um sistema interligado, que tivesse uma
gestão unificada e, o mais importante, que possibilitasse a
comercialização conjunta da produção e a obtenção de melhores preços.
Mas isso não ocorre.
Não ocorre porque a decisão por consolidar
uma economia florestal forte e superior à da pecuária é política. E
isso, sim, falta na Amazônia.
* Professor da
Universidade Federal do Acre, Engenheiro Florestal, Especialista em
Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná e Doutor em Desenvolvimento Sustentável
pela Universidade de Brasília.
Nenhum comentário:
Postar um comentário