* Ecio Rodrigues
Todo cidadão sabe da ineficiência da
administração pública no Brasil, mas só se dá conta do quão longe essa
ineficiência pode chegar quando se depara com contrassensos como o
programa denominado “Agenda Ambiental da Administração Pública”, lançado
no âmbito federal, e conhecido pela sugestiva sigla A3P.
Instituído
no final da década de 1990, o programa só resiste até hoje por duas
razões: a persistência do servidor público, que, sabe-se lá por que,
parece realmente acreditar na A3P; e o completo despreparo dos
dirigentes públicos para tratar do tema da sustentabilidade.
Devido
a esse despreparo, costuma-se chamar de agenda ambiental, por exemplo,
um rol de atividades aleatórias, que frequentemente incluem até a
formação de um coral.
Ora, um conjunto de funcionários cantando o
amor pela natureza e pelo próximo, num espetáculo do tipo
gospel/altruísta, pode até ser algo interessante, uma atração pública.
Todavia, embora possa ajudar a despertar o respeito mútuo e a harmonia
no ambiente de trabalho, um coral não deixa as pessoas, o órgão público,
o bairro, a cidade, a Amazônia, ou o planeta, mais próximos da
sustentabilidade ecológica.
O exemplo mais gritante dos equívocos
que pautam a A3P é a campanha voltada para a substituição dos copinhos
de plástico por garrafas de plástico, as chamadas “squeezes”, que são
distribuídas gratuitamente entre os usuários.
Deflagrada como
algo inovador, a campanha se propõe a reduzir a quantidade de plástico
consumida pelos servidores públicos ao beberem água durante sua jornada
de trabalho. Os visitantes, provavelmente, vão continuar usando os
copinhos descartáveis, já que não vão sair por aí portando canecas ou
garrafinhas.
Além de a proposta não ter nada de inovador – uma
vez que os órgãos públicos já tentaram, sem sucesso, substituir os copos
descartáveis por canecas permanentes –, as garrafas não são melhores
que os copinhos, nem sob o ponto de vista econômico, nem tampouco sob o
da sustentabilidade.
A substituição dos copinhos por garrafas
plásticas não atende ao princípio constitucional da economicidade, tendo
em vista que o custo de uma garrafa corresponde ao de dezenas de
copinhos e, da mesma forma como ocorre com os copinhos, as garrafas têm
vida útil curta, até irem parar no mesmo lugar: no lixo. Significa dizer
que, embora no curto prazo se gaste menos, no médio prazo os custos
serão maiores. Médio prazo, contudo, é um tempo muito longo para a
administração pública.
As garrafinhas também são insalubres. Por
sinal, é provável que a ocorrência de doenças amplie o custo da
garrafinha para a sociedade. Em pouco tempo de uso, as garrafinhas,
mesmo se lavadas, certamente acumularão lodo e, o pior, como não haverá
copinhos de plástico disponíveis, o compartilhamento de garrafinhas vai
ampliar o risco de transmissão de micro-organismos.
Por fim, eis o
que as garrafinhas significam para a sustentabilidade: nada. Não
precisa ser nenhum perito em sustentabilidade para saber que o problema é
o plástico, seja em forma de um copinho ou de uma garrafa. Se por um
lado a garrafa tem vida útil maior do que a de um copo, por outro, o
volume de plástico contido numa garrafa corresponde ao de centenas de
copinhos. E ainda há um agravante. A garrafinha vem com a impressão da
logomarca e a propaganda do órgão, ou seja, vem com uma aplicação de
tinta e um custo de energia muito pouco sustentáveis.
A solução
óbvia para esse simplório problema, que, diga-se, não tem vinculação com
os desmatamentos e as queimadas, essas sim as reais mazelas amazônicas
relacionadas à sustentabilidade, é a substituição da matéria-prima, e
não do recipiente. Copos de papelão, como se usava antes de a humanidade
descobrir o petróleo, é a saída.
Enfim, é preciso apenas pensar –
nem além nem aquém da sede, como apregoa o triste slogan da campanha
das garrafinhas –, apenas pensar mesmo.
* Professor da
Universidade Federal do Acre (Ufac), Engenheiro Florestal, Especialista
em Manejo Florestal e Mestre em Economia e Política Florestal pela
Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Doutor em Desenvolvimento
Sustentável pela Universidade de Brasília (UnB).
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